Amarildo: "Isso é pena para elite", diz líder comunitário sobre condenação de PMs

“Treze anos não vai pagar isso, o que foi dado é pena para uma elite". As palavras partiram do líder comunitário na Rocinha, na zona Sul do Rio, Carlos Eduardo Barbosa, se referindo à condenação da Justiça ao Policiais Militares acusados de participação na tortura seguida de morte do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, em 2013. Carlos Eduardo rebateu ainda as declarações do Secretário Estadual de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, que elogiou nesta segunda (1/2) a sentença e considerou que justiça foi feita. "Ele [Beltrame] diz isso porque não tem noção do que é suficiente para se fazer justiça pela perda de uma pessoa. É algo irreparável", diz o líder comunitário.


"Além de tudo [morte de Amarildo] a família ainda teve que brigar na Justiça por indenização, para que a Beth [Elizabeth Gomes da Silva, mulher do pedreiro] pudesse se cuidar psicologicamente e dos seus filhos", diz Carlos Eduardo. O líder comunitário, em julho de 2013, concedeu uma entrevista ao Jornal do Brasil afirmando que em março daquele ano Amarildo havia procurado a Secretaria Estadual de Assistência Social para denunciar que vinha sofrendo perseguição e ameaças de PMs lotados na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) na comunidade. O caso foi tratado com indiferença, segundo Carlos Eduardo. “O policial identificado como Douglas Vital, conhecido como Cara de Macaco, era o que mais implicava com Amarildo", disse ele na época. Um mês após a entrevista, o governo do Estado admitiu que já tinha conhecimento da violência na comunidade. Carlos Eduardo acredita que o Major Edson Santos, então comandante da unidade seja "apadrinhado da secretaria de segurança".



"Há algo de muito errado. Enquanto a policia estiver investigando a policia, sendo responsável pelas perícias, a gente vai continuar tendo esses casos. Esse processo é como se fosse um modus operandi”, criticou o líder. Apesar de considerar a penalidade branda, Carlos Eduardo se diz "feliz" com a condenação da Justiça. "Pelo menos agora estão ouvindo os menos favorecidos, os negros, favelados", diz ele. “Se ouve falar que eles [policiais condenados] serão expulsos, mas isso é apenas 0,01%", acrescenta. 

Questionado se a decisão da Justiça com relação ao caso pode servir de exemplo para outros policiais que não atuam na legalidade, Carlos Eduardo é taxativo: "As UPPs serviram apenas para o governo se promover”. Para ele, as unidades de pacificação estão causando danos aos moradores das comunidades cariocas. “Já acabaram com centenas de famílias, vários inocentes foram mortos e não precisa ser culto para entender que as notícias violentas correspondem aos fatos. As estatísticas mostram a elevação nos índices de auto de resistência, pessoas desaparecidas nas comunidades. Isso está se refletindo no asfalto, na forma de abandono”, avalia Carlos Eduardo.

A condenação

A juíza da 35ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Daniela Alvarez Prado, condenou oito dos 25 Policiais Militares envolvidos na morte do ajudante de pedreiro, Amarildo de Souza, ocorrida em julho de 2013, na comunidade da Rocinha. Em um trecho da decisão, a magistrada destaca: "vítima de uma cadeia de enganos, era vulnerável à ação policial, além de ser 'negro e pobre, dentro de uma comunidade à margem da sociedade' ".

O Major Edson Santos, então comandante da UPP, recebeu a maior pena, de 13 anos e 7 meses de prisão em regime fechado, pelos crimes de tortura seguida de morte, ocultação de cadáver e fraude processual. O militar foi apontado como o mandante do crime. 

No cado do tenente Luiz Felipe de Medeiros, que na época era subcomandante da UPP, e que de acordo com a sentença orquestrou o crime junto com o major Santos, recebeu da Justiça a condenação de 10 anos e 7 meses. O soldado Douglas Roberto Vital Machado, citado por Carlos Eduardo, recebeu a pena de 11 anos e 6 meses. De acordo com as investigações, ele participou desde a captura até a morte do pedreiro. 

Os soldados Marlon dos Campos Reis, Jorge Luís Gonçalves Coelho, Jairo da Conceição Ribas, Wellington Tavares da Silva e Fábio Brasil da Rocha da Graça foram condenados a 10 anos e quatro meses de reclusão. De acordo com a decisão da Corte, todos os condenados devem ser expulsos da corporação. No entanto, as defesas dos policiais ainda podem recorrer em primeira instância. 

O caso

Amarildo de Souza desapareceu na noite do dia 14 de julho de 2013, durante uma operação policial na comunidade da Rocinha, na Zona Sul da cidade, onde o ajudante de pedreiro residia com a família. O morador foi levado por policiais lotados na UPP para averiguação no contêiner da unidade, que fica no alto da comunidade. Depois disso, ele nunca mais foi visto. 

Segundo a conclusão do inquérito instaurado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), Amarildo foi torturado até a morte pelos PMs e seu corpo retirado do local. No final da última semana, a Justiça do Rio condenou oito dos 25 apontados na participação no crime.

Apesar da sentença e o sentimento de justiça, a família do pedreiro ainda não tem resposta para a pergunta que tomou conta do país e agora reformulada  - “Cadê o corpo de Amarildo?”.

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