Crise na saúde do Rio: ambulâncias somem das ruas e lotam depósito



A falta de peça e itens de reposição automotivo têm esvaziado das ruas do Rio de Janeiro as ambulâncias do SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e, proporcionalmente, superlotado o 
Centro de Suprimento e Manutenção (CSM), em São Cristóvão, na zona central da cidade. Desde o dia primeiro de janeiro não para de chegar ao local as unidades móveis do serviço 192 para manutenção. Cerca de 50 veículos aguardam por consertos que vão desde um motor avariado até uma pane elétrica. Como se não bastasse a infraestrutura deficitária, os bombeiros que trabalham no CBM reclamam ainda das excessivas jornadas de serviço e da nova medida que os obriga a fazer horas extras, mesmo sem o pagamento do RAS (Regime Adicional de Serviço), suspenso desde dezembro pelo governo do Estado.  

O crescente cenário de crise no Corpo de Bombeiros vem afetando diretamente a saúde dos servidores, o que tem motivado a categoria a denunciar os abusos praticados desde o ano passado. Segundo eles, as ambulâncias usadas para atendimento da população estão sucateadas, sem ar condicionado ou ventilação adequada, cheias de baratas e acúmulo de sujeira. Os veículos deveriam passar por inspeção periódica, como recomenda normas da corporação. No entanto, a realidade é bem diferente. "Elas [ambulâncias] rodam 24 horas direto, até parar de vez", conta um bombeiro que pediu para não ser identificado. 

O mesmo servidor descreve ainda outras irregularidades. Os colares cervical estão imundos, com marcas de sangue, e as máscaras de oxigênio apresentam o mesmo estado de desleixo. "Esse tipo de material deveria ser descartável, mas o comando manda reaproveitar", conta. Nem os documentos das ambulâncias escapam das negligências. Os servidores afirmam que algumas unidades estão com os documentos atrasados há três ou quatro anos.

A situação caótica e as horas excessivas de trabalho têm levado muitos servidores ao hospital da corporação, onde conseguem dispensa médica e, consequentemente, vem o reflexo no número de efetivo nas ruas e para atendimento de urgência. "O Corpo de Bombeiros não tem hoje efetivo suficiente para assumir mais este serviço [SAMU]. Os bombeiros já atuam em salvamento, combate a incêndio, recolhimento de cadáveres, salvamento marítimo. Tem o seu hospital para manter, as suas policlínicas. Nós temos um roll de prioridades e de serviços que demandam da atenção de todo o nosso efetivo", explica o vereador Marcio Garcia (Rede), que também é major do Corpo de Bombeiros.  

O parlamentar frisa que nos outros 91 municípios do Estado é a prefeitura que faz a gestão do SAMU. "Se existe uma crise no Estado, o primeiro passo deveria ser devolver para os outros órgãos que não são do Estado estes serviços que hoje a gestão estadual executa. Ou seja, devolver para a prefeitura do Rio o serviço do SAMU, e não o Estado através do Corpo de Bombeiros assumir serviços. Isso está refletindo no atendimento da população", acrescenta Garcia.

Um vídeo gravado na manhã desta sexta-feira (29/1) mostra a quantidade assustadora de ambulâncias paradas no pátio e nas oficinas do CBM. A reportagem foi exibida no Jornal do SBT, que destaca também uma série de deficiência tanto no serviço do Corpo de Bombeiros quanto no 192.  


   

Ambulância quebrada no CSM. Foto: SOS Bombeiros RJ


Dupla jornada de trabalho e somente uma fonte pagadora

Os bombeiros deslocados para o SAMU cumprem uma carga horária de trabalho superior aos demais colegas de farda. Como estatutários do Corpo de Bombeiros (CBMERJ), possuem matrícula. No entanto, estes servidores constam no Cadastra Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) no quadro funcional do CBMERJ e do SAMU, ao mesmo tempo. 

Apesar das duas ocupações, eles recebem apenas o salário e benefícios do Corpo de Bombeiros. Nenhuma gratificação é dada por atuarem no SAMU. O auxílio transporte é de R$ 100,00. Alguns bombeiros alegam que o valor não cobre os deslocamentos necessários durante o mês no trajeto do trabalho para casa e, por isso, são obrigados a bancar a diferença do próprio bolso.

Os bombeiros também não estão recebendo desde dezembro o benefício conhecido como RAS (Regime Adicional de Serviço). Assim, muitos deles optando por não fazer o trabalho na escala extra. Porém, o comando do Corpo de Bombeiros, segundo o grupo denunciante, determinou que as horas extras devem ser feitas de forma compulsória, ou seja, obrigatoriamente. A medida revoltou a classe.

Outra mudança está na forma de convocação dos bombeiros, que agora acontece através do Boletim Interno, sem qualquer comunicação dos postos de chefia, como acontecia antes. Assim, muitos bombeiros que não acompanham em tempo integral o boletim estão sendo punidos por não comparecer ao serviço. 


192: Desvio das metas do serviço

O SAMU foi implantado no Estado com o objetivo de desafogar os atendimentos na rede pública de atendimento hospitalar. No caso do Rio, quando o governo estadual assumiu o serviço, mudanças foram feitas no sistema e acabaram por interferir na dinâmica de atendimento. Os chamados para casos mais simples, que poderiam ser resolvidos no local pelos profissionais da saúde, eram encaminhados pelos sistema de regulação para as unidades hospitalares, provocando uma demanda ainda maior na rede. 

Os bombeiros contam que muitos casos graves, como os de uma colisão ou de pacientes cardíacos, têm que ficar aguardando a liberação da ambulância e de toda equipe de uma ocorrência muito mais simples e sem risco, por exemplo, uma briga de família em que um membro se sente mal. Esta pessoa ainda é, obrigatoriamente, encaminhada para um hospital. 

Os quartéis operam, normalmente, com três tipos de ambulâncias, seguindo uma escala de complexidade de equipamentos para atendimentos simples e de risco. O modelo básica funciona com dois técnicos de enfermagem e o motorista; a intermediária tem também alguns medicamentos; a avançada tem os recursos de uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva). Não existe um critério para a liberação das ambulâncias dentro dos quartéis, sendo assim, uma unidade avançada pode ser chamada para um caso simples e vice versa. Já o efetivo de veículos em um quartel e o tipo de unidade móvel depende da área demográfica, com base nas estatísticas de acidentes no Estado. 


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