Cientista da "pílula do câncer" presta concurso no Rio e comenta sobre estudo

Quem cruzou esta semana com aquela pessoa simples transitando pela Rodoviária Novo Rio, trajando uma camiseta básica e calça jeans, usando duas mochilas para carregar os pertences, não podia imaginar que se trata de um dos cientistas mais procurados do mundo nos últimos meses. Marcos Vinícius de Almeida - um dos integrantes da equipe do professor de Química Gilberto Orivaldo Chierice, da USP de São Carlos, no interior de São Paulo, coordenador das pesquisas com a fosfoetanolamina sintética no combate ao câncer - esteve esta semana no Rio de Janeiro para prestar um concurso público e comentou sobre os avanços dos estudos e a polêmica gerada pela quantidade de liminares na Justiça paulista para receber as pílulas pela universidade.

Apesar dos fatos divergentes e a tranquila rotina quebrada pelo tumulto causado pelas liminares, Marcos Vinícius, de 41 anos, mantém uma aparência de calma e um sorriso permanente, além de muita firmeza ao comentar a pesquisa científica. Durante um bate papo de apenas 30 minutos no corredor da rodoviária, de onde o biotecnólogo embarcou para São Carlos, ele atendeu diversas ligações no seu celular, todas relacionadas ao mesmo assunto: “pílula do câncer”.


Liminares

Quais as novidades relacionadas às liminares na Justiça de São Paulo?

Os entes envolvidos, Governo de São Paulo e federal, estão trabalhando em três vias: liberação para uso compassível; produção em larga escala através da Furp [Fundação para Remédio Popular]; e implementação das medidas. Tem uma reunião agendada nesta sexta (27) com familiares de pacientes com câncer, o governador Geraldo Alckmin e o ministro da Saúde, na capital paulista, para discutir estes caminhos e das liminares. O governo paulista está tentando reverter este quadro de proibição. Cada vez que a USP deixa de fornecer a pílula, paga uma multa alta, não sei precisar quanto neste momento. Esta situação ainda está se arrastando. O governo federal está estudando a substância neste momento, ele tenta comprovar por vias científicas que funciona, até para a liberação das petições vindas de pacientes terminais. Assim, o Tribunal de Justiça não vai criar mais entraves. E a Anvisa também não vai liberar antes de todo este processo. Você imagina que a demanda é de cerca de 600 liminares por dia. O Salvador [Salvador Claro Neto] produz esta quantidade por mês no laboratório. Em um dia acaba tudo. Eu acho que eles [governos] vão criar alguma situação para saber os principais passos a serem dados agora, definir as prioridades. A Anvisa não vai liberar antes disso acontecer. O Ministério da Saúde e da Tecnologia estão trabalhando para comprovar estas substâncias.

Comprovações

Atualmente, o que pode comprovar que este produto tem eficácia?

Tem gente que melhora [fazendo uso da pílula], em outras pessoas diminui o tumor, em outras diminui a dor, tem pacientes que ficam curados, e tem aqueles que falecem. Ou seja, cada organismo reage de forma diferente. Geralmente, quem recebe a cápsula são pacientes terminais. Talvez funcionasse na sua amiga [se referindo a jornalista Mirtes Guimarães, morta na semana passada vítima de um câncer]. Mas, só o fato dela [cápsula] tirar a dor de um paciente neste estágio, temos relatos que um tumor causa muita dor, para a gente já é uma grande vitória. Mas sabemos que tem cura sim, isso é real. Temos laudos enviados por médicos que comprovam isso para a gente, dados clínicos que a Anvisa recebe para criar o seu controle. Tenho inúmeros e-mails e trocas de Whatsapp com estes médicos comprovando tudo. O importante dizer aqui é que ninguém voltou reclamando da cápsula, não há processo pelo uso do produto.

Fórmula

Qual foi a grande descoberta deste estudo? O que funcionou com a fórmula dos senhores que antes não se tinha conhecimento científico?

A patente de síntese que fizemos tem a maior pureza nos produtos que já existem. Junto com a fofosetanolamina, que é um fosfolipídio produzido no fígado e músculos,  tem outros fatores que chegamos na sua manipulação mais limpa. Essa é a diferença. Com isso conseguimos resultados em alguns organismos. Testamos em animal, em pacientes, em nós mesmos. Os estudos ainda não foram concluídos.  Ah, e essa teoria antiga de que a fosfo provoca tumores, já comprovamos que isso não é verdade. Vimos que ela é uma defesa do organismo combatendo a doença, porque ela aumenta a quantidade no corpo com a presença dele [tumor]. Só não experimentamos ainda em todos os tipos de tumores.

Uma produção industrial não influenciaria na eficácia do produto?

Não. Se produzindo em escala industrial não perde a eficácia. A produção agora é no laboratório, mas obedece aos parâmetros da comunidade científica internacional.

Trajetória na equipe

Como o senhor ingressou na equipe do professor Gilberto?

Foi em 2008. A pesquisa do Gilberto Chierice completou 25 anos em 2015. No início a gente teve a parceria da Unesp da Bauru [cidade natal de Marcus Vinícius] e depois do Instituto de Butantã. Quando vimos os resultados positivos, resolvemos patentear.  

A rotina com as liminares

Como os senhores estão lidando com esta questão das liminares?

E´muito duro e triste ver as pessoas, famílias e até os pacientes implorando pelas cápsulas, pedindo uma chance para continuar vivo. Teve um dia destes que um policial militar ajoelhou na minha frente pedindo para salvar a vida da filha dele. Dizem que os cientistas não têm sentimentos, imagina, a gente sofre com esta situação. Todos os dias tem gente nas minhas redes sociais pedindo ajuda. Eu tenho familiares que morreram vítimas de câncer. É complicado [olhos cheios de lágrimas].

Possíveis ameaças

Os senhores já receberam alguma ameaça?

Não estamos recebendo nenhuma ameaça. Nada. Isso não está acontecendo. Mas quem tem família tem medo, claro.

Procura internacional

É verdade que as multinacionais estão querendo comprar a patente?

Tem empresas de tudo quanto é parte do mundo nos procurando para comprar a patente. Não vamos fazer isso. Até porque existe um contrato assinado entre a gente que prevê a aplicação dos recursos vindos desta pesquisa na criação de um instituto que vai se empenhar na descoberta de novos produtos contra a doença.

Futuro de milhões

O senhor pensa que pode ficar muito rico com este estudo? Está feliz com a descoberta?

Quem vai imaginar que de uma tese de mestrado vai sair uma pesquisa desta? Claro que a gente fica feliz, mas não pesamos em riqueza. Pode ver que sou uma pessoa simples, estou aqui pegando o meu ônibus, trabalho para sustentar a minha família... Mas pensamos em conseguir outras conquistas. Que repórter não gostaria de publicar que tal médico encontrou a cura do câncer? (risos).

Avanço científico brasileiro

Qual a avaliação que o senhor faz desta descoberta para o desenvolvimento científico no Brasil?


Se tudo ficar confirmado até o final deste processo [a eficácia da pílula] o Brasil terá portas abertas para novas descobertas. É um avanço exponencial. 

Comentários

  1. Parabéns a Claudia Freitas, pela matéria, visto que todo Mundo busca umas aspas destes cientistas, e não obtiveram êxito. E a estes valorosos cientistas, que lutam contra a máfia das indústrias farmacêuticas, para reconhecerem a eficácia da pílula no combate ao câncer, que tem ceifado a vida de milhares de pessoas no Mundo. Torço para que consigam licença para a produção deste medicamento.

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